Matinal I
Por Vitor Bornéo Todo dia de manhã transporto uma legião de mudos. Uma legião que parece enfurecida com suas carrancas e expressões de desgosto. Encolho-me no meu assento e toco o carro adiante, esperando um bom dia que nunca vem. Olho o trânsito matinal, o fluxo constante e ininterrupto pelas vias abarrotadas até quase o limite e penso em mim como uma espécie de hemoglobina que faz esta cidade funcionar. Fluir. Rio. Rio em seguida porque percebo que nunca penso em meu próprio sangue a não ser quando ele se esvai ou me falta. Acho que isso é normal. Dou um riso que muitos dos meus compartilham, mas que na maioria fica amargo com o tempo – como aquela piada melancólica de humor negro que já perdeu a graça e constrange ao invés de fazer rir. Amarga até nos fecharmos em nossas próprias carrancas e deixarmos de esperar... Ainda sim, sinto orgulho de mim mesmo. Eu guio a todos como iguais e igualdade é ou não é uma coisa importante? Homens fortes e fracos dos subúrbios. Mulheres direitas da...