Matinal II
Por Vitor Bornéo Comprimir-me entre os membros de outras pessoas me traz uma sensação estranha. Em alguns momentos me perco no todo, não sei mais o que sou eu e o que é outro. Onde começo ou termino. Levado a posições estranhas, ponho-me a meditar. Quando supero o incomodo, sinto uma espécie de transe suarento. Não deve ser algo muito diferente do que sentem aqueles gurus indianos em seus rituais de mortificação da carne. Às vezes até fecho os olhos, mas sem descuidar do tato, com medo de que a carteira suma durante meu nivana. Tento pensar que daquela lata de sardinha com pouco ar sairei mais puro. Pura ilusão, talvez. Normalmente saio fedendo e dolorido. Nem sempre, porém, minhas viagens são exercícios de contração que desafiam a física espacial. Isso pode ser melhor ou pior, dependendo do ponto de vista. Como um animal moderno, não é todo dia que me encontro disposto a partilhar meu quinhão de solidão com qualquer desconhecido que ocupa o mesmo banco que eu. Em prol da civilização, ...